“Propas: a noite chuvosa”!

“Propas: a noite chuvosa”! Era uma quarta-feira, início de novembro de 1999 e a hora já estava adiantada. O celular tocou e o identificador de chamadas indicava que era do gabinete do governador. Tratava-se de uma convocação extraordinária, àquela hora, para uma reunião no Palácio Anchieta. A educada chefe de gabinete adiantou-nos que o governador requeria pressa. Aquele dia havia sido cansativo, embora proveitoso. A Empresa de Processamento de Dados do Espírito Santo - Prodest, que presidía

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“Propas: a noite chuvosa”!

Era uma quarta-feira, início de novembro de 1999 e a hora já estava adiantada. O celular tocou e o identificador de chamadas indicava que era do gabinete do governador. 

Tratava-se de uma convocação extraordinária, àquela hora, para uma reunião no Palácio Anchieta. A educada chefe de gabinete adiantou-nos que o governador requeria pressa.

Aquele dia havia sido cansativo, embora proveitoso. A Empresa de Processamento de Dados do Espírito Santo - Prodest, que presidíamos, havia liderado, em parceria com a Secretaria de Gestão e Recursos Humanos, a organização de um seminário com a presença do “bambambã” do planejamento estratégico no Brasil, o professor Vicente Falconi.

Desse modo, aprontando às pressas dirigimo-nos para o Palácio. O céu estava carregado e chovia copiosamente. O encontro estava a esconder grandes e inimagináveis desafios e muitos “problemas” futuros.

Nosso chamado para aquela reunião se dera porque estivéramos ao lado do governador desde maio de 1998, atendendo a um convite especial de um estimado professor da UFES, que tinha o encargo de fomentar, na campanha, o debate sobre a segurança pública e organizar o programa específico, em caso de êxito na eleição.

Além disso, a Prodest, desde fevereiro de 1999, havia passado à classificação de Unidade Estratégica, tendo a Diretoria sido, a partir de então, investida em função militar, através de decreto governamental.

Chegando ao Palácio fomos logo atendidos. O governador, à mesa, em particular, circunstanciou-nos sobre os fatos que geravam aquele inusitado encontro e expressou-se: “a segurança pública foi um importante tema de nossa campanha. Precisamos ter um programa especial nessa área”.

Assim, seguindo a orientação recebida, ainda no final daquela chuvosa noite, incontinenti, convidamos alguns companheiros, todos oficiais da PMES, para tomarem conhecimento do que nos fora incumbido. Era tudo urgente!

A conversa com os colegas que comungavam os mesmos ideais na busca de renovação da segurança pública, em particular da Polícia Militar, seria o ponto inicial de uma pretensa construção. 

Entre os presentes estavam os hoje coronéis, José Nivaldo Campos Vieira, Pedro Delfino, Ênio Chaves dos Reis, João Antônio da Costa Fernandes, Marcus Antonio Konieczna Amaral e um outro que prefiro esquecer. Também participou do encontro que varou madrugada à dentro, o então tenente coronel Eliazer Costa Vieira, hoje aposentado como juiz de Direito.

Era grande o apreço do governador pela Polícia Militar, ele dizia em público que a Instituição era a “menina de seus olhos”. Foi ele como comandante-em-chefe quem decidiu transtornar a mesmice em que vivia os Órgãos de Segurança Pública. A proposta de mudança tinha que ser ousada e realizável.

Por outro lado, naqueles dias, em decorrência do brutal assassinato da jovem Isabela Cassani, era forte o clamor público por providências na ainda desorganizada área da segurança pública.

O então secretário de Segurança Pública, à época, um ”delegado aposentado e ex-deputado federal”, mostrou-se contrário e cético, mesmo informado pelo governador sobre a pretendida reforma na segurança pública capixaba.

Ele era um policial “das antigas”, que não estava dando certo no cargo. Sua mentalidade sobre a imposição da lei e da ordem no formato “anos de chumbo” estava desatualizada.

Retomando a reunião que entrara pela madrugada, a discussão sobre as ideias matrizes para uma política de segurança pública não estava fluindo, pois não encontrávamos consenso sobre o que fazer. Ficamos diante de um impasse e muitas indagações surgiram. As incertezas quase nos desanimaram.

No calor das discussões sobre o chamado do governador, um dos oficiais presentes, conhecido pela sua coragem, contundência e inteligência, surpreendeu a todos os demais, afirmando que aquilo ”era tudo política e que não daria em nada”.

Embora enorme e incerto fosse o desafio, lá pelas tantas, já com os primeiros raios de sol aparecendo no horizonte, a reunião parecia desaguar na postura altaneira dos oficiais da PMES, incumbidos de realizar histórica tarefa.

Assim, mesmo com a noite indormida, durante o café da manhã, voltamos ao Palácio e o governador, sempre solícito, recebeu com satisfação a nossa resposta em buscar atender à hercúlea missão de construir um pioneiro Programa de Segurança Pública, que fosse sujeito aos anseios, às necessidades e às expectativas da cidadania.

Na mesa de café, próxima ao salão do piano, após nos ouvir, o governador retrucou: “os senhores terão três semanas e com certeza farão o melhor”.

O desafio estava lançado!

Mais revelações na próxima semana. Não perca!

Vitória – ES, 14 de janeiro de 2023.

Júlio Cezar Costa é coronel da PMES e Associado Sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

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